Grupo: Complainer, the
Título: Saint Tinnitus Is My Leader
Ano: 2012
Editora: Mik.Musik.!.
Formato: Digital
«Saint
Tinnitus Is My Leader» é
o álbum mais recente do projecto polaco The Complainer,
liderado por Wojciech
Kucharczyk, que desde o início do ano
já tinha publicado um EP («San Columbus»),
um single em colaboração com 8rolek («Wasza Fiesta / Nasza Fiesta»)
e um outro álbum que complementa esta nova
edição («The Saint Tinnitus Gazette»).
No meio de toda esta turbolência editorial, Kucharczyk produz
aquele que é, provavelmente, o seu álbum mais
intimista e pessoal. Por um lado, porque todo o processo foi conduzido
a solo, sem as habituais colaborações que
caracterizam os seus trabalhos (com incidência especial
quando opera enquanto um membro de The
Complainer & The Complainers). Mas, ao
mesmo tempo, toda a sonoridade é conduzida no sentido de um
mergulho nos recantos mais obscuros da sua emotividade, funcionando
como uma espécie de busca interior.
Quando comparado com trabalhos anteriores, «Saint
Tinnitus Is My Leader» soa muito mais negro, com
o ritmo lento a contrapor-se ao frenezim do passado e as vozes, quase
fantasmagóricas, a serem manipulações
sintetizadas de pequenos enigmas, que assim ganham uma aura misteriosa
e quase impenetrável. Ao mesmo tempo, toda a
microscópica parafernália de fragmentos sonoros
de electrónica analógica exige uma
dedicação extra ao ouvinte para que possa ser
integrada num conjunto vasto de deambulações
melódicas, que se vão libertando em pequenos
golpes de magia negra e ocultismo, como se envoltos num
véu opaco e de tonalidades nocturnas. Não por
acaso, tinnitus
é sinónimo de zumbido.
Ganham forma, assim, canções intensas
que, aqui e ali, subtilmente adquirem uma componente
dançável, mas que não chegam a
deixá-la atingir o zénite das
pistas pela carga sombria em que são envolvidas,
tanto pela solenidade dramática de alguns teclados
enigmáticos, como pela compulsão pesada de linhas
de baixo em cisão física fragmentária.
Como se a festa se passasse na casa ao lado e apenas a
pulsão e os ecos filtrados do entusiasmo
fossem capazes de atravessar as paredes.
Há também momentos de abandono ao peso
de emoções melancólicas, como
se cada fase de solidão fosse
imprescindível para encontrar o rumo da
celebração, mesmo que em ambiente privado. Um
uivo angustiado de uma presença ausente.
Daqui resulta um disco que é uma espécie
de composto explosivo latente, que se encontra na eminência
de detonar em todas as direcções, mas que The Complainer
consegue controlar de um modo perfeito, prevalecendo uma
espécie de ameaça que marca profundamente a
capacidade dramática da narrativa assim
construída mas cujo desenlace, ao ser ludibriado, permanece
eternamente como uma brilhante promessa ao virar da próxima
curva. O que mantém todos os sentidos em alerta e faz de «Saint Tinnitus Is My
Leader» um disco viral, mais dominador a cada
nova rotação, e um estranho magma de inquietude e
desejo, que através dos sons visa interrogar e atingir o
núcleo emocional da existência humana.
|